sexta-feira, 15 de abril de 2011

Ampliando o conceito de cuidado

        Para alcançar uma noção mais completa de cuidado, os profissionais da área de saúde, devem se preocupar em ir além do que Ayres (2004) chama de normalidade morfofuncional, pois o ser humano não é somente biológico. Há um sujeito por trás das doenças que se apresentam nos consultórios. Muitas vezes alguns psicólogos também se preocupam muito mais com as patologias do indivíduo, e não consideram o sujeito que se apresenta para ele, tratando-o dentro de modelos pré-estabelecidos, como se o ser humano não fosse passível de mudanças. O contexto no qual ocorre situações nas quais o indivíduo necessita de cuidado, é um contexto coletivo. Cuidar implica ver esse sujeito na sua individualidade, com o seu adoecimento que é fato, é uma construção histórica e também socialmente configurada. . É necessário que se vá além da doença em si e considera os outros contextos de interação nos quais ela emerge.
            O autor salienta a importância de se buscar a totalidade existencial que permita dar significados e sentido não apenas à saúde, mas ao próprio projeto de vida do indivíduo. Ainda que a técnica seja essencial, segundo Ayres (2004), a sabedoria prática também deve ser posta em ação. Ao se considerar que esta tem origem na práxis, podemos nos perguntar como alguns profissionais que não exercem este tipo de sabedoria podem continuar por tanto tempo na profissão exercendo-a de maneira puramente técnica.
            Fica explícito no caso da D. Violeta que quando a dimensão de cuidado é ampliada para além do orgânico, passa haver realmente “encontros”, como o próprio autor coloca, entre médico e paciente. Ou seja, quando D. Violeta se sente acolhida como um todo, não só seus aspectos orgânicos disfuncionais estão sendo considerados, mas sua história de vida como pessoa que como toda que é para além do biológico.
            O texto de referência questiona como alguns profissionais da saúde, mais especificamente os médicos, não se preocupam com o projeto de felicidade de seus pacientes. Mas também deveríamos nos perguntar como alguns psicólogos, que pensa-se ser uma profissão em que o cuidado é intrínseco, estão exercendo o cuidado. Ayres (2004) evidencia que o cuidado deve ser uma atitude terapêutica que busque o sentido existencial do indivíduo, e nem sempre esta prática é alcançada, uma vez que alguns psicólogos acabam por rotular os indivíduos, tentando enquadrá-los em algumas pré-determinações. Não se deve, em nenhuma profissão que lide com seres humanos, desconsiderar o fato de que eles têm projetos e que estes não se esgotam devido à doenças ou a quaisquer motivos que se apresentem. Deveríamos sempre como bons profissionais, buscar resgatar isto em cada sujeito, desta forma estaríamos não só exercendo o cuidado como também promovendo a saúde.
            Esta discussão nos fez recordar um caso contado por uma professora nossa, e que dizia de uma experiencia vivida por ela. Por sentir dores no joelho, ela procurou um médico ortopedista para consultar, uma vez que acreditava ser este o especialista capaz de ajudá-la. O médico então faz uma ligação para outro colega, pois de acordo com ele seria  o mais  indicado para tratar dores específicas de joelho, e diz na presença da paciente: “estou encaminhando um joelho para você”. A professora indignada sai do consultório dizendo “ fala com ele que o joelho vai embora”.Quantas vezes já não passamos por essa situação? Independente de ser público ou privado, nos deparamos com momentos  em que somos tratados apenas como joelhos, pés, barrigas... patologias. A falta de um olhar que supere a consideração puramente física, sem perceber toda a complexidade do ser humano, faz com que não nos sintamos acolhidos, trazendo desconforto e descrença nos profissionais e suas técnicas. Sabemos que as técnicas são de suma importância, mas que só elas não são suficientes.
            Não é só com os médicos que ocorrem isso, mas também com os profissionais psicólogos, que muitas vezes apenas encaixam os indivíduos nas estruturas “psicótico, neurótico, perverso”. Não que essas estruturas devam ser desconsideradas , mas devemos estar atentos ao sujeito que está ali e que é muito mais que uma estrutura mental.
            É importante que a noção de cuidado seja abrangida para além das técnicas, para que até essas mesmas se mostrem mais eficientes, pois quando se cuida do todo aumenta a chance de ocorrer maior eficácia nos tratamentos, além do fato de que  o outro também se  sentirá valorizado em sua complexidade humana. Precisamos observar quais valores, saberes e instrumentos podem ser utilizados para agirmos da melhor maneira possível nestas situações.
            Construir  o Cuidado é portanto, investigar sobre as raízes e significados sociais do adoecimento em sua condição de obstáculos, articulados com iniciativas teóricas e práticas que vinculem os cuidados individuais na dimensão coletiva. É assim que pensamos ser possível construir uma verdadeira relação de cuidado.


Texto postado pelo grupo: Andreza, Ariane, Lidiane e Renata

3 comentários:

  1. Bacana, mas uma vez que o sujeito deve ser olhado ou cuidado em sua totalidade como fica a questão das profissões e suas especialidades? Só uma provocaçãozinha, para esquentar o debate.

    O texto está muito bom, parabéns!

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  2. Acredito que mesmo os profissionais com suas especialidades devem aprender a olhar o sujeito em sua totalidade. Por mais que o profissional vá atender somente uma parte, irá se atentar mais para aquele ponto específico, ainda assim acho que deve haver preparação para que ele possa ter uma visão mais ampla, pensando que aquele indivíduo não é apenas sua doença, mas ali também existe um sujeito que sofre, que está inserido no social e que tem muitas outras demandas além da que aquele profissional está atendendo naquele determinado momento.

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  3. É impressionante como o tamanho do avanço tecnológico da sociedade moderna (não só na saúde, mas como um todo) parece cegar ainda mais os profissionais da saúde para a ligação corpo-mente ao invés de lhes ampliar a visão.
    Atendimentos que atentam também para o lado psicológico do paciente, sua vida pessoal, problemas que não se limitam apenas aos aspectos biológicos, possibilitam também um diagnóstico mais completo, evitando até o uso de tratamentos que possam agredir o indivíduo não só física, mas psicologicamente também.
    Breuer e Freud já teorizavam e defendiam a eficácia do método de "Cura pela Fala" (1880), o que representou e ainda pode representar uma significativa mudança nos métodos terapêuticos modernos se for melhor considerada.

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